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O Império Contra-ataca. Primeiro o fim do mundo figurativo. Agora o fim do mundo literal. Não bem. Mas quase. Só um bocadinho mais a Norte.

Wednesday, May 02, 2007

Dia 3 ::: 10-03-2007 ::: Ushuaia

Esta manhã o Hostel acordou mais vazio. Ou pelo menos estava mais vazio quando eu acordei. Acho que assim estará mais correcto. Digo mais vazio porque o Esteban, companheiro dos últimos dias já não estava. A sua aventura patagónica tinha chegado ao fim, infelizmente para ele. E para nós também.

Começa o dia às 10h. Não era suposto ser tão tarde mas também não faz mal. O programa hoje era mais relaxado. A manhã estava reservada basicamente para duas coisas: sacar as fotos para um cd (feito facilmente) e comprar a minha saída de Ushuaia. Por falta de boleia, a ideia de seguir de veleiro até Puerto Williams e daí seguir para Punta Arenas no cargueiro da Marinha chilena estava fora de hipótese. O próximo destino turistico era Torres del Paine, no chile e, a meu ver, a melhor maneira era seguir num autocarro para a cidade que serve de suporte ao dito parque: Puerto Natales.

Se bem pensei, pior fiz. Ignorando os avisos, deixei para a última a compra do bilhete. Meus amigos... chegar a Ushuaia é fácil. Sair... é outra conversa. Nada de bilhetes de autocarro. A única hipótese é depois de amanhã seguir para Punta Arenas e daí para Puerto Natales. Tendo em conta as distâncias, provavelmente terei de dormir em Punta Arenas uma noite. Menos mal... ao menos tenho companhia. A Corinna segue para lá também. Na verdade, ficar mais um dia em Ushuaia não era um sacrifício por aí além...

Tratadas as questões burocráticas, engolido à pressa um almoço e sacadas algumas fotos parvas na cidade, decidimos voltar ao Parque Nacional da Tierra del Fuego. Tinham-nos aconselhado fazer os outros caminhos, mais pequenos que o outro que tinhamos feito ontem. Além de que ver o fim da Panamericana é sempre um chamariz interessante. Quanto mais não seja para dizer que estive lá. Nesta altura o grupo era: Eu, Corinna, Rosa e uma nova aquisição, a Sabrina, argentina porteña que conhecemos na noite anterior, ou nessa manhã, já não sei bem.

Fotos parvas na cidade.

Negociado um preço com um amigo taxista lá nos fizemos ao caminho. Pelo meio foi fazendo o papel de guia. Parecia um pouco ofendido de cada vez que tentávamos confirmar alguma coisa que tinhamos ouvido sobre Ushuaia e dizia sempre que não a tudo. Contava 1001 histórias. Desconfio que nem metade eram verdadeiras mas também não importa para nada. Chegados ao local, foi hora de nos fazermos ao caminho. Tinhamos de ter cuidado com o tempo porque tinha ficado combinado que o nosso motorista improvisado estaria no parque de campismo à nossa espera às 18h para o regresso. Com 15 minutos de tolerância.

E assim estavamos de volta ao ambiente de fadas do Parque Nacional da Tierra del Fuego. Vegetação rasteira e alta, verde amarela e vermelha principalmente. Coelhos por todos os lados. E os lagos iam aparecendo como enormes espelhos deixados ali ao acaso.


O chão estava cheio de umas bolinhas pretas fruto da digestão bem sucedida das ervas por parte dos coelhos. Para bom entendedor... Esta espécie de alcatifa preta lembrou-me a história de um primo meu que coleccionava nos bolsos azeitonas enquanto passeava num monte perto de casa dos meus avós. Umas azeitonas estranhas, sem caroço, não muito duras e que curiosamente não caiam das Oliveiras mas sim das cabras. Felizmente nunca lhe deu para provar. Acho eu. As tantas provou e nunca disse a ninguém. Mas pensando bem... quem é que diria?

E é no caminho que damos de cara com dois amigáveis italianos de Bologna que já haviamos conhecido no hostel. O Luca e o... qualquer coisa que agora não me lembro. Ainda fizeram connosco boa parte do caminho, por vezes no meio do mato, outras vezes na estrada de terra batida (a tal Panamericana, aqui chamada Ruta 3 – já explico), as vezes mais perdidos e outras vezes menos.


Pelo meio chegámos ao mirador da Bahia Lapataia. Uma vista de cima sobre a enorme baía, rodeada de árvores e travada por uma montanha nevada cujos cumes se fundem no branco das nuvens. Um silêncio imponente que nos faz quase sussurrar quando falamos. Gostava de ter estado ali sozinho. Com o meu mp3 ou simplesmente um livro. Ou então estar apenas.




A primeira parte da caminhada termina então no final da famosa ruta. Passo a explicar. Na argentina há duas estradas particularmente conhecidas. Uma só da Argentina, a outra muito internacional. A primeira é a Ruta 40, uma estrada que cruza toda a Argentina desde o Norte em La Quiaca até ao sul em Rio Gallegos. A outra, a tal que é internacional, começa (ou acaba, como quiserem) em Ushuaia, passa por Buenos Aires, cruza a Argentina em direcção ao Chile e sobe até... ao Alaska. Pois... está praticamente completa, faltando apenas um pouco na Colômbia. Consta que é uma estrada que vem já dos tempos em que os continentes americano e asiático estavam juntos. E diz-se que seguia pela Sibéria. Ora eu nesta não acredito muito... mas enfim... Ora oficialmente a Panamericana termina em Buenos Aires. Mas aí segue uma outra estrada que será a sua continuação. A Ruta 3. Basicamente, quer isto dizer que é possível seguir do Alaska até Ushuaia sem sair da mesma estrada. A não ser naquele tal lugar de que já falei. São nada mais nada menos que 17.848 kilómetros meus amigos. Coisa pouca, portanto. E não deve ser nada interessante conhecer esta estrada de ponta a ponta.


Quando as fotos começam a ser muitas saem ideias como:
Vamos ver quem faz a pose mais estúpida. Acho que ganhei.
O lugar é o fim da Panamericana com a Bahia Lapataia por trás.


Para o fim estava reservado um fenómeno no mínimo interessante. Foi na Lagoa Negra que o conhecemos mas parece que está a a acontecer um pouco por toda a Tierra del Fuego. Passo a explicar: No fundo dos lagos e lagoas estão a acumular-se todo o tipo de elementos orgânicos (paus e folhas que caem das árvores por exemplo). Até aqui nada de fantástico. Parece que acontece em todo o lado. Mas calma meus amigos que o interessante ainda está para vir. Parece que devido às baixas temperaturas, à acidez da água e ao pouco oxigénio da zona, ao contrário do que é normal, estes elementos não sofrem daquela coisa chata (e que até nós, eventualmente um dia sofremos) que é a decomposição. Como tal, vão-se acumulando no fundo até chegarem à superficie. Como se não bastasse, diz que há alguns desses elementos que têm elevada capacidade de absorção de água. O resultado final é, nada mais nada menos que um enorme colchão orgânico. Mais mole numas zonas e mais duro noutras é tão interessante e bonito como perigoso. É que há zonas onde a coisa não está tão sólida e passar em cima dela pode significar mergulhar naquilo até 7 metros de profundidade. É coisa para ser um bocadinho desagradável. Que o diga a Mexicana que ontem a fazer uma corrida se enterrou numa até aos joelhos. Parece que aquilo é tipo areia movediça. Quanto mais uma pessoa tenta sair mais se enterra. Teve de ser puxada de lá para fora e com a agravante de que os ténis ficaram lá em baixo. E eu não estava presente!! Ainda hoje penso que o meu blog poderia ter ganho projecção mundial com uma ou duas fotos da cena!!
Mas dizia eu, parece que este fenómeno se está a estender por toda a Tierra del Fuego e dizem alguns especialistas pessimistas que eventualmente um dia tudo aquilo que hoje é lago poderá vir a ser um Turbal. Turbal é o nome deste manto que se forma. Pelo menos na Argentina.

Os Turbais começam por ser isto debaixo de água.

Até que começam a aparecer à cá em cima.

E ganham este aspecto.

E tornam-se mais sólidas sendo até possível andar em cima delas.
Olhem para a minha cara de convencido disso, com a passadeira bem ali pertinho por via das dúvidas.

E foi então que tivemos a brilhante ideia de olhar para o relógio. Caros amigos... faltavam 30 minutos para a hora marcada com o taxista e restava-nos uma caminhada (olhando a coisa de forma optimista) de 1 hora. Solução? Boleia!! Três alemães e um boliviano, aparecidos do nada num Land Rover. Salta para a mala tipo cão e toca a andar.

A noite, como de costume é para divertir. Entre o hostel e um bar, entre resumir o dia e rir-me com o americano que bebeu demais e entrou em 3 casas de banho antes de descobrir o quarto e que, não contente com isso, decidiu rolar na cama que, só por azar, era o beliche de cima. Coisa pra doer. É americano, não faz mal. Alguém tem de pagar pelo que o Bush anda a fazer estes anos todos...

No mp3: Roads - Portishead

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