badge

O Império Contra-ataca. Primeiro o fim do mundo figurativo. Agora o fim do mundo literal. Não bem. Mas quase. Só um bocadinho mais a Norte.

Wednesday, November 07, 2007

Dia 25 ::: 31-03-2007 ::: Uyuni e o voltar à Argentina

O dia foi um bocado secante. Já tinha dito que Uyuni pouco ou nada tinha para se ver. E confirmei-o no dia seguinte. Já com bilhete comprado, deixei o hotel bem cedo. Parei na praça principal em busca de um café onde comer. O problema é que era feriado e não havia rigorosamente nada. Sozinho numa cidade sem nada, a sentir outra vez falta de um grupo, o dia afigurava-se desesperadamente desinteressante. Acabei por encontrar um quiosque aberto onde me sentei a comer e a escrever. Foi aí que conheci um casal de argentinos cujo nome já não recordo. Simpáticos, foram uma boa companhia para um dia parado.


O centro



Depois de andarmos às voltas pela cidade em busca de lã de Llama que a rapariga insistia em comprar ali por ser muito mais barata que na argentina, resolvemos visitar o famoso Cementerio de los trenes. Era a única coisa ali para conhecer e diga-se que é manifestamente pouco. É engraçado por ser uma amálgama de metal. Carris, carruagens e máquinas e outras velharias dos caminhos-de-ferro ali são largados a envelhecer e a enferrujar. O ambiente é no mínimo estranho mas a piada esgota-se rapidamente. Para juntar à festa, ao longe, um grupo meio estranho de locais está escondido numa carruagem. Não sei o que estariam a fazer mas achámos melhor não descobrir. Não valia a pena o risco. Além disso, começavam a ser horas de comer alguma coisa porque eu tinha a camioneta daí a poucas horas.


A caminho do Cementerio de los Trenes.

O cemitério. Ou o que eu consegui fotografar dele.


De volta ao centro da cidade, era agora tempo de fazer horas. Instalámo-nos num café de um posto de turismo e aí fiquei a perceber que fiz um péssimo aproveitamento da bidimensionalidade do salar de Uyuni. Uma exposição de fotografias mostrava ideias fantásticas que não eram nada difíceis de reproduzir. Paciência. Fica para a próxima.

Boas ideias = Boas fotos.


Às 19h00 era hora de ir para a camioneta. Numa enorme rua, imensos autocarros amontoavam-se a carregar passageiros. Entre uns (poucos) modernos, a maioria era ferro velho. O meu não escapava à regra. Ora se já estava ansioso com a viagem (pelo meio de deserto, sem estradas, com ravinas altíssimas e nenhuma segurança) ainda mais fiquei quando vi o "bólide" que me ia levar. Minúsculo, com rodas enormes, malas em cima do tejadilho e completamente podre por dentro. O cheiro não era muito agradável. Mas havia de ser pior mais à frente. Pelo sim pelo não, enviei uma sms à mais-que-tudo a dizer a camioneta em que ia, como se chamava a companhia, a que horas saia de Uyuni e a que horas chegava à fronteira Argentina. À resposta "Tenho motivos para estar preocupada?" não tive coragem de responder. A verdade é que nem eu sabia.

O autocarro era igual. Só que mais podre. A estrada... era bom era.


E aí vamos nós. Poucos km depois de Uyuni, entramos pelo meio de um deserto de areia interminável. Aqui e além o autocarro atolava na areia. Foi aí que percebi a função do outro senhor que ia ao lado do motorista. Saia do autocarro com uma pá e ia escavando à frente do autocarro. Estou feito… Para me distrair e não fazer filmes (eu faço muitos filmes) decidi iniciar conversa com as outras duas pessoas não nativas e da minha idade que ali estavam. Um inglês e uma sueca. Começámos com a conversa do costume. Trajectos, onde estivemos, onde vamos, o que gostámos mais, impressões, etc. etc. etc.. Estávamos nós no tema política (outro tema típico nestes encontros culturais) quando fazemos uma paragem para ir à casa-de-banho. Foi aí que percebi que casa de banho não é para todos. A senhora que ia à minha frente, por exemplo, assim que desceu do autocarro deu um passo, subiu a saia e foi ali mesmo. Um belo xixi. Eu atrás, estava trilhado entre a senhora e a pessoa que estava atrás de mim à espera de sair do autocarro. Foram momentos de habilidosa tentativa de fugir à corrente enorme que se formava mesmo ali à minha frente. Consegui sair ileso, que é como quem diz, seco.
Seguimos viagem. Alguns erros no trajecto levam o motorista a improvisar. Já tinha dito que nesta zona da Bolívia não há estradas, ou praticamente não há. O caminho faz-se em cima de areia, por caminhos de cabras e, nesta altura, por aquilo que me parece ser um rio seco. A conversa esgota-se no cansaço dos meus companheiros de viagem. Resta-me então dormir. O que consegui, ainda que a espaços fosse abrindo os olhos. Mas o facto de olhar pela janela e ver que estávamos num caminho esburacado estreitíssimo com uma ravina de 50 metros a pique ao meu lado (o luar continuava cheio e para mal dos meus pecados a iluminar tudo) fazia-me ter uma repentina e enorme vontade de os fechar outra vez.
Deviam ser umas 6 da manhã quando parámos. Tinham-me dito que o autocarro era directo à fronteira. Afinal, tinha de mudar. Saí e olhei o outro autocarro. Era mais novo. Grande. Espaçoso. Era um upgrade. Ou não. O autocarro ia cheio e boliviano que se preze não espera por uma casa de banho para fazer o que tem a fazer. Faz o que tiver que fazer onde tiver que fazer. O cheiro dentro do autocarro era nauseabundo. Durante os primeiros tempos tive de me controlar. Depois, felizmente, adormeci. Quando acordei estava na fronteira com a Argentina. Atravessaria a fronteira a pé. Num processo pouco demorado (uns 30 minutos do lado boliviano) disse adeus à Bolívia e a tudo o que de fantástico ali tinha visto. Fazia promessas de voltar para ver o resto. Mas naquele momento estava mesmo feliz por estar de volta à minha linda Argentina.

Promessas de volta. Mas por agora, muita felicidade por estar de volta à Argentina.


A meio da ponte que liga os países.


No mp3: Clandestino – Manu Chao

0 Comments:

Post a Comment

<< Home