Olhar para um espelho para ver para trás sem ter de me virar. Juro que não é por preguiça! É para não perder a vista à frente.

Antes que comecem os boatos como "Ena pá o rapaz até tem jeito para a fotografia" devo dizer que a foto é real mas o arrastamento é montagem. E nota-se bem. Photoshopada e da rafeira. Mas vendo bem este miserável blog não merece melhor.
27 de Julho de 2006. Aterro em Argel, por volta das 13h. Começou a aventura. Chegava com alguns receios e bastantes ilusões sobre o que estaria à minha espera. Tinha na ideia uma Argélia difícil, sem dúvida, mas engraçada, interessante e desafiante. A ideia desvanesceu-se rapidamente como foram percebendo. As coisas más para dizer iam-se acumulando sucessivamente e as boas eram raras. A ida a Tipaza não foi de certeza a melhor maneira de começar. Ou então até foi. Fosse por onde fosse dei de caras à primeira com os piores aspectos de Argel: O Vazio, a Insegurança (aqui simbolizada pela figura dos polícias armados de Kalashikov), a Sujidade e o Caos, os Ótarios e a Sociedade Obsoleta.O V.I.S.C.O.S.O., portanto. Sei que ao final desse primeiro dia, quando me deitei na cama a primeira coisa em que pensei foi “Onde é que eu vim parar?”. Logo surgiu a frase: “Oh meu Deus, vim parar ao fim do mundo!”. Daí o nome do blog.
Mas quem me conhece sabe que, acho eu, não sou de me deixar derrotar à primeira. À segunda talvez e à terceira de certeza. Mas à primeira acho que não. A menos que fosse contra o meu irmão. Quando eramos pequenos ele fazia a sua pausa nos estudos para treinar boxe e gastar as suas energias em mim. Ora a minha táctica aqui era estar derrotado à partida. O resultado é que a porta do quarto dele abria e eu já estava no chão do outro lado da casa a espernear e a chorar. Perdendo acabava por ganhar. Pelo menos ele desistia. Já não dava forra. Bem.... talvez também uma francesinha também me derrote à primeira. Se estou num dia em que não me apetece sair de casa, não saio mesmo. A menos que o tema seja francesinha. Aí derreto-me à primeira e lá vou eu. E estava aqui a pensar também que os meus tios, primos, tias, primas, irmão, irmã, pai, mãe, amigos, amigas, namorada, (aqui não há masculino), conhecidos, conhecidas, desconhecidos e desconhecidas me derrotam à primeira numa corrida de Karts. A culpa não é minha. Dão-me sempre o pior Kart. Aliás... dão-me um corta-relvas tal é a tendência que o veículo tem para ir para fora da pista. Não sou eu! Ele é que tem vontade própria.
Portanto, dizia eu, tirando nos descansos de estudo do meu irmão quando eramos crianças, tirando se o assunto for francesinha e esquecendo a hipótese de se tratar de uma corrida de karts, acho que não sou pessoa de desistir à primeira.
Decidi uma nova abordagem. Esqueci a casa com puffs, as chichas todas as noites, os cafés com dança do ventre e decidi encarar a desgraça com sentido de humor. E aí nasce o blog. A história, penso que a maioria de vocês foi acompanhando. Havia dias em que esta estratégia resultava e outros em que não. Mas lá ia fazendo a minha vida e o meu trabalho. O problema é que esta estratégia é um bocado como deixar de fumar. Estamos cheios de vontade ao início e resulta. Mas o entusiasmo vai-se perdendo e a coisa torna-se cada vez mais difícil. Ao fim de um tempo, e juntando já a vida complicada que tinhamos e mais algumas confusões que teimavam em acontecer todos os dias e em vir escarrapachadas nos jornais, o entusiasmo deu lugar ao desânimo e o desânimo trouxe a desmotivação. Ao fim de um mês e qualquer coisa já só pensava que nunca iria aguentar seis meses ali. Felizmente as coisas resolveram-se e acabei por conseguir mudar de país. Ainda por cima para a Argentina, onde tenho a certeza que me vou integrar bem a todos os níveis.
Posto isto, resta fazer um balanço. Acaba por ser aquilo que já disse antes. Tendo sido o tempo que foi, considero que valeu a pena. Aprendi coisas na Argélia. Se calhar pessoalmente aprendi mais ali que noutro sitio qualquer. Aprendi a ter capacidade de sofrimento e a viver com pouco. Re-aprendi francês e pude perceber melhor a maneira de pensar dos muçulmanos ditos normais e dos ditos extremistas. Mas acho que as coisas mais importantes que aprendi não tenho noção delas agora. Talvez daqui a uns tempos, quando a poeira assentar e as informações que trago de lá sedimentarem possa ver o efeito da Argélia em mim. O que posso dizer é que, repito, tendo saído agora, a experiência na Argélia valeu a pena. E muito. O problema é que estavamos a chegar a um ponto de estagnação. Sentia que o que o país tinha para me dar já me tinha dado. Senti que para a frente daquilo seria mais do mesmo. E isso é que não podia ser. Voltarei à Argélia certamente. Mas daqui a um bom par de dezenas de anos para poder ver as mudanças de um país que está a crescer muito rápidamente (dinheiro há e vontade também agora é só ver como eles fazem as coisas). E para poder conhecer o resto do país que me esteve vedado também. E para ir ao deserto. Sim porque deserto a sério não é na Tunisia ou em Marrocos. É na Argélia meus amigos.
Além de todo o conhecimento e vivências que trago comigo de Argel, trago também coisas más e más experiências. Mas provavelmente, serão essas que mais me ensinarão ao longo da vida. Mas acima de tudo trago comigo algumas pessoas que me ensinaram bastantes coisas e que guardo e levarei comigo para onde quer que vá.
Agora abrem-se as portas de uma nova aventura. Se tudo correr bem, parto do Porto dia 6 de Novembro para aterrar em Buenos Aires no dia 7, 22 horas depois (com escala em Frankfurt). É tempo de deixar o ventre e passar ao tango. É tempo de manter o francês e desenvolver o espanhol. É tempo de aprender coisas novas outra vez. E é tempo de, tal como na Argélia, dar novamente o melhor que posso e sei. Bora lá?
Ena pá! Afinal o balanço acabou por ser grandote. Mas ainda assim não teve piada. Portanto só se pode falar de meia mentira. hihi